
Dia seguinte: o drama, o horror, o pânico. Sem telemóvel, descobri que deixei de saber de cor todos os números de telefone. Ou melhor, percebi que apenas sei 4 números de telefone:
- o número de casa dos meus pais, afinal, a minha adolescência foi feita na base do telefone fixo (não, eu não sou assim tão velha, este mundo é que, em algumas coisas, avança a uma velocidade estonteante…), sem Messenger, sem hi5 e com muitos gritos do meu pai e pseudo incursões pedagógicas sobre a real vocação do telefone: transmitir recados e não alimentar conversas durante horas. Bah! Daddy, agora eu percebo, no teu tempo eram sinais de fumo…
- o número de telemóvel da minha mãe, porque (é quase embaraçoso dizer isto), apesar de morar sozinha há quase dois anos e de praticamente apenas almoçar em casa dos meus pais ao domingo, mantenho o hábito de diariamente enviar uma sms à mummy: “Mãe, hoje não vou jantar aí a casa. Beijo”. À força de o fazer todos os dias, durante quase dois anos… fixei o número.
Até aqui, tudo bem. Agora, curioso foi verificar que a malandra da memória ainda regista o número do Arquitecto (ex, ex). Fiquei estupefacta! Não uso esse número há anos e, entanto, quando, sem telemóvel, tentava resgatar alguma combinação numérica do meu baú, eis que surge o : 93 GGGDFJG. Aparecia assim, de uma forma muito nítida, sem hesitações. Naturalmente, em fase de negação, pensei “nã, nã pode ser o n.º do cromo”. Resgatado o telemóvel (fofucho) confirmou-se, era o número dele, que ao fim de tanto tempo sem uso permanecia ali empoeirado na prateleira da minha memória (ele é com cada uma!).
Bom, e depois há o teu número… Apaguei-o do telemóvel há umas semanas, bem como tudo o que te dizia respeito. Foi uma limpeza feita por fases. Reli todas as mensagens antes de as apagar, mergulhando nessas águas paradas dos momentos vividos em que acreditei termos sido felizes. Contemplei todas as fotos antes de as apagar também. Eram sobretudo fotos de verão, de suadas brincadeiras na cama, em que te apanhava a dormir exausto e sereno como uma estátua. Cada registo que apagava doía-me como se me apartasse de mim às migalhinhas…
Não ligues, hoje tou assim trenga e carente. E, logo hoje, o teu número pôs os sapatos de dança e teima em rodopiar coreograficamente no salão da minha memória, fazendo leves riscos num chão recentemente encerado…