Há uma pedra que cresce e que me afasta de ti. Alimenta-se dos sedimentos de silêncio e de incomunicação que depositamos entre nós. Agigantou-se de tal modo, que não nos permite estar na mesma divisão. Dilatou-se ao ponto de me expulsar da nossa cama, porque não cabemos lá os três. E tu insistes em não a quebrar. Teimas em não perceber que a minha força diminui e que os golpes que desfiro nessa montanha são cada vez mais inócuos e inofensivos. Viras a cara para não perceber que esse pedregulho me entala nas paredes da nossa casa, me esmaga na estreiteza da minha garganta. Desespera-me o esforço do gesto cansado que procura antecipar o que queres, o que te faz feliz. Desgasta-me o estado de alerta que não me deixa dormir, porque aguardo o sobressalto e a agitação em que ficarei, assim que ouvir a tua chave na porta, assim que o mundo declarar que vais invadir e que, a partir daí, se inicia a guerrilha terrorista da palavra, do movimento, do silêncio, da quietude que, a partir do inesperado, me ataca e transforma esta serenidade fria de alumínio numa lâmina que me atravessa a garganta. E tu, até aí, não dizes nada. Tu, depois disso, nada dizes. Nada muda. Colocamos a serenidade cortante em posição de ataque e volta tudo ao início, tudo a repetir-se: adivinhar-te, sobressaltar-me, vigiar-te, armadilhar-me, chorar-te, matar-nos mais um bocadinho...
Vivemos em tormento e tu insistes em virar a cara para o lado, para a frente para trás, para todo o lado menos para o animal em agonia em que nos transformamos. Porque não falas? Estarás bem assim? Será isto o que tu queres? Com certeza é, mas a mim não me basta. Para mim, basta! Para que acordes, para que percebas que isto assim não está bem, para que mudes provisoriamente durante duas semanas, para pelo menos ganhar um abraço, conquistar um olhar, arrancar-te uma palavra que me seja dirigida. Para que recordes o desespero gravado no corpo da última vez que estiveste próximo do abismo de me perder. Isso, essa memória vai fazer-te entender…
Mas não. Já não há memória, já não há medo, já não há olhar e os teus braços não se movem para me abraçar. Os teus braços apoiam-se na pedra que nos separa, enquanto arremessas balbuciantes "não sei” a tudo o que pergunto. O teu corpo instala-se nessa maldita laje que nos separa para me atirar, sem aviso prévio, essa indiferença e apatia que desconheço. "Não sei"?!? Mas, então, há quanto tempo "não sabes"? Há quanto tempo te arrastas para casa como quem caminha para um covil de lobos? Há quanto tempo me magoas propositadamente? Há quanto "não sabes" e ainda assim fingias surpresa quando te dizia que não estávamos bem, que precisávamos de conversar? Há quanto tempo "não sabes" e eu me consumo sozinha neste pântano de culpa por não nos querer assim?
E eu, que era só certezas, desfiz-me nesta espiral de loucura e irracionalidade que te vasculha os bolsos do casaco em busca de uma razão chamada Maria, Alexandra, Rosa... E eu, que só precisava de esboçar-te um olhar, indiciar-te um sorriso, para te ver rendido à paixão, perco-me neste catálogo de artifícios de sedução inúteis perante a força da tua indiferença. E eu, sempre a poupar-te, porque tu sofrerias mais, tu eras o eterno e desajeitado apaixonado. E eu, sem dúvida, acharia fácil deixar-te partir, até ao momento em que descobri que já cá não estavas, que tinhas abalado numa noite que desconheço, sem dizer adeus, como um ladrão, roubando-me o que me pertence: o poder de decretar a tua partida. Porque, agora, estou refém deste quarto vazio, confundindo as migalhas com o bolo, misturando o amor com o apego, Achando que, perante esta dor, a felicidade é adivinhar-te, sobressaltar-me, vigiar-te, armadilhar-me, chorar-te, matar-nos mais um bocadinho.
Não sei se a História e as histórias são pedagogos eficazes dos afectos, das emoções e dos sentimentos. A compaixão redigiu esta história que não é minha, mas podia ser, porque é de alguém muito próximo que nunca imaginaria (e que nunca se imaginaria) encontrar no enredo que vive nestes dias difíceis, lodosos e cinzentos. Que o sorriso, com que pintas de azul os dias, se desenhe novamente no teu rosto, D.
Vivemos em tormento e tu insistes em virar a cara para o lado, para a frente para trás, para todo o lado menos para o animal em agonia em que nos transformamos. Porque não falas? Estarás bem assim? Será isto o que tu queres? Com certeza é, mas a mim não me basta. Para mim, basta! Para que acordes, para que percebas que isto assim não está bem, para que mudes provisoriamente durante duas semanas, para pelo menos ganhar um abraço, conquistar um olhar, arrancar-te uma palavra que me seja dirigida. Para que recordes o desespero gravado no corpo da última vez que estiveste próximo do abismo de me perder. Isso, essa memória vai fazer-te entender…
Mas não. Já não há memória, já não há medo, já não há olhar e os teus braços não se movem para me abraçar. Os teus braços apoiam-se na pedra que nos separa, enquanto arremessas balbuciantes "não sei” a tudo o que pergunto. O teu corpo instala-se nessa maldita laje que nos separa para me atirar, sem aviso prévio, essa indiferença e apatia que desconheço. "Não sei"?!? Mas, então, há quanto tempo "não sabes"? Há quanto tempo te arrastas para casa como quem caminha para um covil de lobos? Há quanto tempo me magoas propositadamente? Há quanto "não sabes" e ainda assim fingias surpresa quando te dizia que não estávamos bem, que precisávamos de conversar? Há quanto tempo "não sabes" e eu me consumo sozinha neste pântano de culpa por não nos querer assim?
E eu, que era só certezas, desfiz-me nesta espiral de loucura e irracionalidade que te vasculha os bolsos do casaco em busca de uma razão chamada Maria, Alexandra, Rosa... E eu, que só precisava de esboçar-te um olhar, indiciar-te um sorriso, para te ver rendido à paixão, perco-me neste catálogo de artifícios de sedução inúteis perante a força da tua indiferença. E eu, sempre a poupar-te, porque tu sofrerias mais, tu eras o eterno e desajeitado apaixonado. E eu, sem dúvida, acharia fácil deixar-te partir, até ao momento em que descobri que já cá não estavas, que tinhas abalado numa noite que desconheço, sem dizer adeus, como um ladrão, roubando-me o que me pertence: o poder de decretar a tua partida. Porque, agora, estou refém deste quarto vazio, confundindo as migalhas com o bolo, misturando o amor com o apego, Achando que, perante esta dor, a felicidade é adivinhar-te, sobressaltar-me, vigiar-te, armadilhar-me, chorar-te, matar-nos mais um bocadinho.
Não sei se a História e as histórias são pedagogos eficazes dos afectos, das emoções e dos sentimentos. A compaixão redigiu esta história que não é minha, mas podia ser, porque é de alguém muito próximo que nunca imaginaria (e que nunca se imaginaria) encontrar no enredo que vive nestes dias difíceis, lodosos e cinzentos. Que o sorriso, com que pintas de azul os dias, se desenhe novamente no teu rosto, D.
Foto: "Longest Journey" de Thorsten Jankowski.
3 comentários:
Até chegar ao último parágrafo estava deveras intrigado porque é que alguém que via as coisas com tamanha lucidez se mantinha presa nas malhas destrutivas de uma relação moribunda.
Pressenti que era um olhar para trás e não errei por muito. Era um olhar de quem está de fora...
(E assim te deixei um comentário sério. Esperemos que não se repita!)
Vénia.
:)
Ervi,
Entre Ervi e Mendel, para além do sentido de humor, também habita uma imensa perspicácia. Mas, que não se repita a graça de perspicar coisas sem a dita :)
Stephen,
Agradecida :)
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