sexta-feira, 25 de julho de 2008

Dolce fare niente



Oficialmente, inicia-se hoje o período de dolce fare niente. Oficiosamente, como atesta a (in)actividade do blog, esse tempo há muito que se iniciou...

Dormi mal... O calor dos último dias insiste em depositar-se integralmente na minha habitação. Abri as janelas, na esperança de plantar correntes de ar e, assim, espantar os excessos da canícula. Se calhar, não fiz bem... Acordei de madrugada com o alarido da chuva e dos trovões, enrolei-me com mais força nos lençóis, procurando remeter a intempérie para um espaço subconscientemente onírico, mas a manhã molhada, cinzenta e pesada empurrava-me para a realidade de uma cidade onde o verão é uma farsa colectivamente encenada.

Fico pelo burgo, nestas férias. Ainda não resolvi o problema da tv cabo e caso o sol insista na greve, sem atender aos serviços mínimos a que a estivalidade obriga, terei de arranjar forma de me (in)ocupar. E isto introduz um factor de stress de insegurança ontológica: as manhãs reservarão sempre a surpresa de adivinhar qual a estação do ano a usufruir. Não me agrada!

Defini objectivos mínimos para este tempo, tão só, reforçar a frente de batalha do desânimo, do desalento e do cansaço. So help me... someone!

Foto: "Brisa do entardecer", de Luís Lobo Henriques

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Para que nem tudo fique na mesma...

Normalmente, a mudança abraça-se com a relutância com que, de olhos fechados, se aperta o caule de uma rosa selvagem entre os dedos. Resiste-se à troca do que é familiar e conhecido pelo que é incógnito e oculto. É assim nas mais pequenas coisas: a alteração do percurso habitual para casa, a troca da marca de café, a incursão num bar que não é o habitual... É assim nos alicerces estrutrais de vida: mudar de cidade, sair do país, terminar uma relação...

O risco de apertar um espinho e sangrar apenas é celebrado quando supera uma rotina demasiadamente pesada, quando grita mais alto do que a tautológica repetição do que nos é insuportável...

Respondi hoje a um anúncio de emprego. Até aqui, não haveria novidade. Há três anos que trabalho no mesmo sítio, mas nunca me coibi de estar atenta a outras potenciais ofertas. Mas as candidaturas foram sempre feitas com a displicência do que é acessório e supérfluo. Preocupavam-me os argumentos que teria de arranjar para declinar educadamente eventuais respostas positivas, alimentando a perenidade do cenário laboral presente. Mas, hoje, ao responder a esse anúncio, ocupava-me o pensamento a projecção desse novo emprego, o desejo por essa equação futura de incógnita desconhecida. Definitivamente, é urgente encontrar saída e soletrar M U D A N Ç A.




Foto: "Na luz de um desenho" de Bruno Silva.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Decomposição

Osga, o teste diz que sou assim:

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E o pior é que vim sem livro de reclamações! Uma vergonha...

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Muito pouco nada



Eu tenho um sonho, cada vez mais e mais intenso: trabalhar pouco!

Nos dias que correm, não é bem visto dizer que se trabalha pouco. Note-se que com pouco, se entende um número ajuizadamente pequeno de horas, isto é, as 8 normativamente prescritas em código laboral (actualmente sob revisão). Dizer que se trabalha apenas as 8 horinhas constitui uma gaffe social, sancionada com olhares reprovadores e imediata catalogação com a etiqueta do fracassado-pouco-ambicioso-nunca-há-de-ser-ninguém"!

A situação socialmente bem cotada é, então, trabalhar muito, isto é, no mínimo, para além das 8 horas diárias. Este é o cenário narrativo ideal para expor em contextos sociais diversos. Fica bem dizer, “eh, pá, eu ando a trabalhar uma média 12, 14 horas por dia, mais fins-de-semana”. Quando ouço algo deste género (da minha boca ou de terceiras) viajo até aos tempos idos da Revolução Industrial, nos manuais de História, em que me chocavam sempre os relatos da época, sobre 14 e 16 horas de trabalho em subsolo de carvão, com condições inimagináveis. Nas novas “explorações mineiras”, vulgo entidades empregadoras, os mineiros, vulgo colaboradores flexíveis esgrimem entre si argumentos sobre quem trabalha mais horas e menos tempo livre tem, assim como os velhos, em bancos de jardim e autocarros, disputam o lugar no pódio das maleitas e o lugar cimeiro na maratona das doenças.

Foto: Moi meme a bulir fora d'horas.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Intimidade



Na semana que passou, ao final do dia, perdi-me em busca de uma localidade remota algures na periferia do Porto. Conduzia um pouco à toa, achando que as placas de informação me elucidariam e que a hora de ponta não me atrapalharia. Quando percebi que me encontrava num ponto sem referência dei a busca por terminada e querendo regressar a terra conhecida, vi-me forçada a resgatar um caminho recentemente abandonado que percorria unicamente para encontrar os braços que desejava. Refazer esse caminho, conduziu-me à formulação de pensamentos tontos. Desfilavam no tapete da minha memória os impulsos que outrora me comandavam os passos naquele percurso, os diferentes trajes de desejo com que o corpo se vestia de latejo e palpitação… Aqueles pensamentos magnetizavam aquele local, impeliam-me para aquela casa, “só para confirmar se ela ainda lá estaria”. Avistar aquele carro, confirmando a continuação daquela presença, já descontínua em mim… Prosseguia em controverso colóquio comigo mesma: ir; não ir; vantagens; desvantagens… Até que tu provas, mais uma vez, que as coincidências existem. Tu provas, mais uma vez, que me adivinhas, mesmo sem saberes. Tu resgataste-me desse redemoinho lodacento da memória e atiras-me para um futuro certo e próximo, quente e aconchegante… Peixe grelhado e arroz de tomate cozinhado por ti, para mim?! É claro que quero jantar contigo, só quero jantar contigo…

Tenho resistido à tentação de escrever sobre ti. Tenho tentado evitar depositar as palavras que podem empilhar-se e formar um “nós”. Sim, é sobretudo isso. Parece-me que se não escrever, se não falar do assunto ele não se torna coisa, não assume uma verdadeira existência. E é, tão só, porque me assusta a ideia de perda. Aquela ideia de perda cujo horizonte traçaste com umas, simples, irrepetíveis (quem sabe, até, ocas), palavras. Aquela assustadora e injusta ideia de perder o que não se viveu. Mas, é justamente a viver, a agir, a fazer que temos criado um “nós”, quase sem reticências. Não tenho, nem desejo (salvo em alguns momentos de puro terror de naufrágio) contornar a acção, evitar os momentos, os nossos instantes em que essas palavras parecem um idioma estranho sem qualquer correspondência à realidade. Até agora, a única coisa que pedes é que seja a vontade a ditar a rotina dos nossos encontros: a minha e a tua. Tem sido assim e tem sido tão bom… E foi desse modo que o peixe ganhou cor e gosto, que os misteriosos grãos brancos se imiscuíram crescentemente com a água e o tomate, que o vinho se elegeu para molhar a conversa que entre nós já não cessa. E foi desse modo que esboçamos uma dança quando o Paul Desmond tocava Adeus, que sentamos em uníssono os corpos no sofá e que as mãos se tocaram como faíscas que tudo o resto incendeiam. E foi num rasto de fogo, de terra queimada onde muito mais promete germinar, que nos quedamos na tua cama, como se o meu corpo ali pertencesse e os teus braços tivessem sido concebidos para me embalar até adormecer. Amanheceríamos juntos para um dia comum, para a banalidade que nos preenche e caracteriza no compasso regular e previsível de todos os dias. Enganar o despertador, fintando as horas de levantar, alternar banhos, tomar o pequeno-almoço, fitar-te no elevador e desejar-te: um bom dia… como se todos os dias tivessem sido assim, mas desconhecendo (porque nunca se conhece) como serão os próximos. Quero-te assim também, nessa normalidade idêntica, sem nada de extraordinário, nesse desfiar dos dias que se contam iguais e cujas diferenças apenas se vislumbram através de uma inquietante e rara proximidade, através da frágil teia de intimidade que sem molde e sem planos urdimos sem querer.

Foto: "A inversão do tempo" de Ana Franco.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

... pouca uva

Então, foi intensa, sim senhor, mas tudo bem esprimidinho resume-se a meia dúzia de linhas:

- Euro 2008:
A moral da história é mesmo, "prognósticos, no fim do jogo...". Os ditos "favoritos" foram caindo que nem tordos até restar uma Espanha invicta no final do campeonato. A Alemanha também lá esteve e, num daqueles heurísticos momentos televisivos, em que se inquirem os adeptos, o jornalista lá perguntava "e, então, acha que a Alemanha vai ganhar a final?" e respondia a senhora alemã com inusitada sabedoria, "ah, eu até gostava, mas eles não se mexem!". Pois, não mexem, mas mordem... só que não é sempre! Humpf! Ainda por cima antipatizei solenemente com a camisa imaculadamente branca, vincada e justa do treinador, sem uma mancha de suor ao fim de sucessivos 90 minutos agonizantes!

- Noite de S. João
Só mesmo para a facção ortodoxa e fundamentalista da festa. As tradicionais orvalhadas do dia santo começaram a orvalhar logo de manhãzinha. Portanto, não se vislumbrou uma nesga de sol e as gotículas de humidade cinzenta e pegajosa decidiram não dar tréguas. A sardinhada exigiu perícia e rapidez, porque, com a chuva, o bicho começava a boiar no prato. A hora de ver o fogo de artifício originou trocas de argumentos persuasivos sobre dispensabilidade do guarda-chuva com os senhores que se encontravam à minha frente. Não tive fôlego para o intenso debate que se seguiu sobre a qualidade do dito espectáculo pirómano, até porque previa o desfecho conclusivo: "ah, o do ano passado foi muito melhor!" (mas, alguém se lembra realmente como é que foi o fogo do ano passado?!?). Passagem pela Ribeira, estadia prolongada em Miragaia pó bailarico, pois claro! Definitivamente, não gosto de chegar de manhã a casa, fico toda trocada.

- Dia de S.João
O despertador lança-me piropos ao meio-dia. Decido ignorar, porque "mulher séria não tem ouvidos". Volta a insistir ao meio dia e meia hora. Constato que não é possível levantar-me e deslocar-me a casa dos meus pais, para deglutir o assado sério da minha mãe. Envio sms, "mãe, não vou almoçar". A mãe telefona: "atão, não vens?", "não, estou muito atrasada", "mas, ainda não vamos almoçar já", "pois, mas não tenho muita fome". Ao que se segue um extenso questionário sobre o conteúdo do meu frigorífico e sobre os viveres com que me alimentarei (a minha mãe tem duas grandes preocupações para comigo: comer e dormir. Mais, a minha mãe tem duas dimensões explicativas para os possíveis problemas que eu possa ter: "ah, não comes como deve ser" ou "ah, deitas-te às quinhentas e não dormes quase nada". Já deixei de retorquir, limito-me a assentir com um lento e envergonhado movimento de cabeça).
No meu vagar, lá me levantei, tomei banhinho, comi chocapics (a base de uma alimentação saudável) e fui até às praias de Gaia esplanar com quem me tem ocupado os pensamentos (e não só...) nos dias que correm. Quem diz esplanar, diz jantar e quem jantar, diz nanar... Não, isso não, porque no dia seguinte:

- Congresso em Lisboa
Lisboa é uma cidade deserta. Não mora lá uma só pessoa. Há figurantes que são pagos para se deslocarem nesse espaço diariamente, pintando-o de movimento e cosmopolitismo. Porquê? Porque, ou eu tenho muito azar, ou não há uma pessoa a quem me tenha dirigido, a pedir uma informação geográfica, que detenha esse conhecimento. Já experimentei com polícias, funcionários do Metro, empregados de café, velhotes desocupados... Nada. Não sabem, não são dali, estão naquele sítio a trabalhar há pouco tempo... Enfim, gasto uma pequena fortuna em táxis que fazem por ignorar o meu sotaque estrangeiro e me exigem que escolha um caminho, entre percursos que desconheço. Puff...
Quanto ao congresso, decidi ignorar a maratona que a organização propunha, exposta num programa de 200 páginas (!!!), e optei pela solução congresso-buffet. Escolhi umas coisinhas e fui peregrinando no meu ritmo. Concluí que há gente com muita lata e outra tanta (nomeadamente, eu) que não tem nenhuma. O grau de lata varia em função da posição que ocupamos: comunicador/receptor. Há comunicadores com muita lata, malta que não tem nada, mas mesmo nada para dizer, mas ainda assim vai lá mostrar a inocuidade dos primeiros anos de trabalhos de doutoramento (que suspeito, estarão eternamente inacabados). Há receptores (como eu) que constatando o desaforo intelectual que algumas apresentações constituem, nada dizem. Há ainda a estirpe que opta por falar, elogiando o "notável trabalho do caro colega". Irrita-me sobremaneira este pa-ta-ti-pa-ta-tuá. Irrita-me ainda mais, não ter tomates para quebrar com essa polida e densa hipocrisia social que alimenta egos e nada acrescenta ao trabalho que se pretende realizar. Portantos, ignorei os "parabéns" e os "podia dar-me o seu e-mail, tinha muito interesse em trocar umas impressões...". Bah!

- O regresso:
Em comboio rápido, com ar condicionado, com direito a recepção na estação de Campanhã e mais jantarinho e tutti-tutti, foi bom, muito bom. Mas, esta semana foi presenteada com um capricho tecnológico. É que até ontem, como diria a Carol de uma qualquer Little Britain, perto de nós: COMPUTER SAYS NO! Felizmente, já se resolveu...